O Maior e o Mais Ousado
Michael Phelps (EUA) e Thiago Pereira (Minas/Florida) tem histórias diferentes. Entre 2012 e 2016, Phelps foi às raias da piração. Se viciou nas drogas, teve a habilitação cassada, frequentou a rehab e ressurgiu das cinzas qual fênix. Enquanto isso, Thiago Pereira continuava sua vida regrada com vitórias, prata no Mundial de Kazan e despontava como favorito mais e mais.
Ontem, os dois se reencontraram pela última vez, no sexto dia dos Jogos Olímpicos Rio 2016 para a natação, no Parque Aquático Olímpico da Barra, nos 200 medley. A expectativa de todos nós seria ver um pódio com Phelps, Ryan Lochte (EUA) e Pereira, ou até Phelps, Pereira e Lochte. Afinal, estes eram os principais nomes desta prova no mundo, junto com Kosuke Hagino (JAP). Infelizmente não foi isso que aconteceu, apesar das orações, rezas e mandingas.
Até que Thiago começou bem. Nos primeiros 50 metros era o líder, com 24.74, contra 24.91 de Phelps, no borboleta. No costas, a disputa foi tão intensa que ambos terminaram empatados a metade da prova, com 53.45. Lochte estava assaz distante e sentiu a pressão, tentando e não conseguindo alcançar ambos. No peito, Phelps, quase sempre fraco neste estilo, disparou um pouco e Thiago manteve o pique: 1:26.96 a 1:27.37. Poderia ser a confirmação de que o peito decidia.
Aí chegamos à última e mais crucial de todas as partes: o nado crawl. Phelps disparou, abriu muito, deixou a concorrência para cravar o melhor crawl, 27.70. Ouro claro e cristalino, 1:54.66. O quarto seguido. O vigésimo segundo. O décimo terceiro individual. O 992 da história americana. E assim, Michael Fred Phelps III torna-se O MAIOR DE TODOS OS ATLETAS OLÍMPICOS da humanidade, vencendo até Leônidas de Rodes, que, antes de Cristo, ganhou doze vezes, três em cada prova, qual seja, o estádio (cerca de 180 metros), o diaulo (cerca do dobro do estádio) e na corrida hoplitódromo, na qual os participantes tinham que usar proteção nas pernas, elmo e escudo. Agora Phelps será eternizado em todos os Olimpos, todos os livros de história.
Já Thiago... bem, como explicar? Ele sabia que o ouro seria difícil. Poderia lutar pela prata ou pelo bronze. Mas algo dentro de sua cabeça o disse que o negócio era superar Phelps e ser ouro em casa, para agitar a torcida e conquistar as manchetes. Diante de um Greatest inspirado, seria quase impossível. E quando a cabeça pensa errado, o corpo padece. E padeceu na hora errada, 25 metros antes do final, quando simplesmente Thiago travou. E passou por ele boi, passou boiada. Passou Hagino, prata com 1:56.61. Passou Shun Wang (CHN), que nem na lista de favoritos à medalha era, e ganhou o bronze com 1:57.05, inesperado até por ele. Passaram mais três, Lochte inclusive, que foi o quinto com 1:57.47. E só não passou Dan Wallace (GBR), oitavo com 1:58.54, mas ia passar.
Então, como explicar o sétimo lugar, com 1:58.02, inclusive com o pior crawl em uma final olímpica ever, com 30.65? "A sensação dos 150 é que já estava queimando bastante o corpo inteiro. Puxei o máximo, cheguei morto, não conseguia nem rodar o braço no final. Fiz tudo que podia, mas não foi. Tem hora que não vai. Foi meu melhor, o máximo que podia fazer nesse momento. Essa é a dureza dos Jogos Olímpicos. Mas tem que confiar naquele lá de cima. Se não aconteceu agora, não era para ter acontecido".
Talvez essas sejam as melhores palavras, mas as imagens da prova dizem mais. Não vamos ter mais o duelo Phelps e Thiago, visto que mesmo após a prova, o Greatest anunciou que vai voltar a ser mito e não mais competirá (eeeeeeeeeu duvido). Agora Thiago está com muita lenha para queimar e deve se despedir depois de Tóquio 2020. Certo é que ele deve figurar no Troféu José Finkel, daqui a exato um mês, em Santos. E é capaz, sim, de se recuperar do trauma. Mas, se para ele não deu medalha, a gente pode dar uma para ele: a de Mais Ousado!
A segunda parte do panorama deste dia 5 vai ao ar ainda nesta sexta.
(informações do Best Swimming, Yes Swim, Swim Channel, ESPN, SwimSwam, Terra e Swimming World - imagens de Satiro Sodré/SSPress/CBDA)